terça-feira, 25 de maio de 2010

Recordações...


Há muitos e muitos anos era eu ainda uma jovem mãe [pirralha!] cansada de passar noites inteiras a dormir com metade do meu cérebro alerta devido às ausências por motivos laborais do sócio e porque viviamos num local cuja acessibilidade era um petisco para os amigos do alheio [e naquela altura tava na moda!], quando numa noite a metade do meu cérebro a quem tinha calhado a folga foi abruptamente acordada pela outra metade. Ouvia uma voz de homem que me parecia estar dentro da minha casa, mais exactamente na sala e não era a do que lá vivia. É que às vezes a pessoa tinha a mania de receber telefonemas durante o periodo noturno mas nunca teve a consideração de se levantar e ir falar para outro lado, o que corroborou a minha teoria. Portanto o sócio não era.

Fiquei ali estarrecida a olhar para o tecto na esperança de que quem quer que fosse, se retirasse assim como chegou e de preferência sem me incomodar mais. Não sei quanto tempo fiquei naquilo, ainda tentei distrair-me com a palete de cores que já tinha pensado em usar naquele tecto, que as cortinas já iam à vida e que em situações daquelas até me dava jeito ter uma arma em casa, pois que aulas de auto-defesa ou qualquer coisa que exigisse esforço físico, posições engraçadas acompanhadas de gritos mais ou menos avisadores ao adversário, tinham há muito sido postas de parte por tudo que já disse, mas sobretudo porque parece que quem domina essas artes tem por obrigação fazer saber ao opositor que as domina e assim dar oportunidade a quem lhes atreve fazer frente de considerar ali um ponto de situação a ver se aquilo vale a pena.
Ora estas coisas aborrecem-me. Acho-as uma perda de tempo e injustas.
Então anda uma pessoa a esforçar-se a aprender aquilo tudo, ele é cinturão disto cinturão daquilo, uma canseira e depois quando pode aplicar a coisa ainda tem que pedir autorização? Era o que faltava. Dêem-me uma arma e à medida que a bala saísse, a coisa ia-se resolvendo sem precisarmos de chagar à fala.
Não gosto de conflitos. [sou um pazdálma!]
Disse isto tudo assim calmamente ao sócio quando ele chegou a casa nesse dia.
Depois de lhe ter explicado o assunto da voz que parecia que vinha de dentro mas que de facto estava fora (fui elucidada sobre a localização do bêbado que a emitia, quando ele desesperado porque não conseguia abrir a porta da casa que não era dele mas que ele podia jurar a pés mais ou menos juntos e tibuteantes que era sim senhores! - foi o que ele garantiu à polícia - que era sim senhores! e que ele era um agente secreto da embaixada da suíça, por isso mais rexxxxpeeeitininhooo faxavoreee ... a justificar os pontapés desferidos à mesma) e que aquilo não podia continuar assim e que eu tinha uma criança pequena e outra a caminho!
Isto tudo enquanto caminhava furiosamente pela casa deitanto abaixo tudo o que o meu barrigão de 8 meses [custou a crescer, mas derrepente fez PUM!] conseguiu tocar. Continuei o meu discurso, disse-lhe que achava inacreditável que ele não se preocupasse com o assunto e que é que tinha ele que se pôr a trabalhar àquelas horas da madrugada.
Terminei com um QUERO UMA ARMA! ao mesmo tempo que dava uma volta de 180º capaz de por a Padeira de Aljubarrota ou até mesmo ( porque não?) a Joana d'Arc para sempre caídas em esquecimento. Sim, porque não fosse aquele teatro todo a ver se alguém se lembrava delas.
Não me esqueci do braço no ar, determinado, com o indicador em riste em direcção às alturas, esqueci-me foi de mais uma vez medir as distâncias e aquilo só não primou pela perfeição porque a cria ( não fui eu) lá mandou com mais uma coisa que tinha sido caríssima ao chão.
Não me desmanchei, continuei ali por um bocadinho a aguentar a postura. Depois entendi que já era suficiente e que ele já tinha recebido a mensagem. Foi quando achei por bem pôr-lhe os olhos em cima, pois que até aí tinha estado propositadamente a ignora-lo e estava a fazer-me confusão o rapaz não se ter manifestado até então.
Lá estava ele, meio sentado meio de pé, com uma mão no bolso e a outra no coração, expressão que variava entra a ausência e o horror. Sussurrou qualquer coisa, quase imperceptível a um ouvido menos sagaz, tirou a mão que acalmava o orgão que nos mantem vivos e com ela procurou apoio no braço do sofá, enquanto mantinha a outra dentro do bolso não a agarrar aquilo que mantem a maioria dos homens vivos, mas sim o que o mantinha a ele. A carteira. É que uma arma custa dinheiro. E a desamparar alguma coisa, pois que seja o coração que sempre é auto suficiente.
O que ele murmurou foi lá no idioma dele, mas que traduzido para o nosso quer dizer mais ou menos : ó Deus meu Pai Santíssimo que o raio da mulher enlouqueceu de vez! [ai tadinho! que ainda penou um bom bocado comigo!]
Não que eu domine a língua, nem pouco mais ou menos, o que consigo fazer muito bem é combinar as cores que se lhe afloram às faces com as respectivas emoções.
Azul= raiva
Amarelo=medo, dinheiro.
Branco=possíveis namorados das filhas [íamos ter pelo menos uma]
Verde= eu
Encarnado= muito eu
Ás vezes consigo até nacionaliza-lo com as cores da nossa bandeira!
Bem, não consegui a arma. Mesmo depois de lhe garantir que ia lá fazer o curso de tiro ao alvo e tudo o que se exige para o porte de uma, ele não concordou.
Esqueci-me de uma côr:
Cinza= quando ele teme por ele.
Que foi a côr apresentada no derradeiro NÃO!

HOJE agradeço-lhe por isso.
Porque, se ele não tivesse morrido por si... era eu que o tinha matado! [se tivesse tido a oportunidade de nascer, devia tar  perto dos dias de fazer 6 anos]


Sem comentários:

Enviar um comentário

gente doida